Por Cássio Ribeiro
Imagine um tempo em que nada podia ser dito, principalmente a verdade. Congresso Nacional fechado e a imprensa censurada. Foi num mundo assim, ou melhor, num Brasil assim, aquele da Ditadura Militar (1964-1985), que a Tropicália vicejou.
O Tropicalismo nasceu quando um grupo de artistas baianos (Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, e o grupo Os Mutantes, que contava então com uma jovem vocalista chamada Rita Lee) se uniu nas apresentações dos festivais de música popular brasileira, promovidos pelas emisoras de TV, entre os anos de 1967 e 1969.
Na impossibilidade de falar abertamente contra a Ditadura Militar em suas canções, os tropicalistas tinham como sua principal característica o deboche e a ironia. Não faziam e nem poderiam fazer suas críticas de oposição ao Regime Militar abertamente.
Os tropicalistas reunidos na foto que virou capa do disco Tropicália, considerado um manifesto do movimento
O deboche era expressado por meio da atitude na vestimenta e nos arranjos. As experimentações exóticas nas canções tropicalistas chocavam o público erudito, acostumado com um padrão musical que a tropicália teve a ousadia de quebrar naqueles anos, mudando assim, de forma indireta e por meio da sua expressão cultural inovadora, as regras e os padrões estabelecidos como normais nos padrões das músicas daqueles tempos.
O tropicalismo tinha manifestações de oposição política em seu comportamento e expressão musical, porém, as músicas expressavam oposição à Ditadura de forma indireta, ao acrescentar o acorde hilário de um instrumento musical no meio de uma letra séria.
A grande influencia para o surgimento do Tropicalismo na década de 60 veio do Movimento Antropofágico das décadas de 1920 e 1930. Ligado ao movimento da Arte Moderna, que tinha ícones artísticos e culturais como Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Mário de Andrade e Anita Malfatti, o Antropofagismo pregava uma absorção das culturas exportadas pelos EUA e pela Europa, seguida por uma digestão repleta da introdução de manifestações e valores culturais brasileiros, para em seguida expressar um novo produto cultural modificado e cheio de características nacionais.
A grande diferença entre o Movimento Antropofágico e o Tropicalismo foi que o segundo digeria cultura popular também, enquanto que o primeiro modificava apenas aquilo que era erudito e exportado pelas potências culturais norte americana e européia.
Numa época em que os artistas que faziam oposição ao Regime Militar com manifestações diretas e incisivas em seus trabalhos eram torturados, perseguidos e deportados, o comportamento debochado tropicalista, embora tenha tido contribuições criativas dos maestros Rogério Duprat e Júlio Medaglia, não foi bem aceito pelos intelectuais e por grande parcela da juventude que militava no movimento estudantil de oposição política à Ditadura Militar.
Os tropicalistas foram tachados de alienados por absorverem e fazerem uso de influências culturais dos EUA e da Europa, num tempo em que as manifestações nacionalistas, norteadas pela oposição à Ditadura Militar, não via com bons olhos o que vinha de fora e fugia do tradicionalmente brasileiro.
Confira a música Tropicalia, de Caetano Veloso, no Link http://www.youtube.com/watch?v=yiwx1oPnEM4
Com o tempo, os militares perceberam o tom debochado de oposição empregado pelos tropicalistas e, com a prisão e a deportação de Gilberto Gil e Caetano Veloso, o Tropicalismo chegou ao fim após uma curta e intensa duração de cerca de 3 anos.
O compositor, cantor, ator, arranjador e eterno tropicalista Tom Zé
Outras manifestações do Tropicalismo também foram observadas nas artes plásticas, no teatro e no cinema, com o chamado Cinema Novo de Glauber Rocha. Atualmente, Tom Zé é um dos principais nomes da MPB que ainda emprega o estilo tropicalista em suas letras e nos arranjos de suas músicas.
Realmente uma aula de História. Meus parabéns ao Cássio Ribeiro.
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