terça-feira, 28 de agosto de 2012

O IMPERIALISMO AO PÉ DA LETRA




Por Cássio Ribeiro

Os dicionários da língua portuguesa definem, num contexto generalizado, o significado da palavra império como: (1 - Nação regida por um imperador), (2 – Autoridade, comando e domínio) e (3 – Grande empresa ou conjunto de empresas de um único dono).

O Brasil libertou-se de Portugal em 1822, passando a ser, a partir de então, uma nação teoricamente livre e independente. Porém, o contexto surgido um pouco antes, a partir das revoluções Francesa e Industrial inglesa, apresentou ao mundo uma nova classe muito mais tirana que as anteriores (senhores feudais e nobreza); falo da burguesia, aquela mesmo que, como dizia a letra do saudoso poeta Cazuza, fede.

Fede a burguesia, dentro de uma mesma nação, quando explora o ser humano operário pobre. Fede a burguesia, quando coloniza, invade, catequiza e impõe suas regras de mercado, que transformam países com imenso potencial como o Brasil, livre em teoria desde 1822, em meros dependentes colonizados em pleno correr do século 21.




Esta dominação começa por meio da dependência econômica e se complementa numa intensa influência nos costumes culturais do país dependente. Apresentando nosso Brasil como exemplo, até a década de 1960, nossa cultura era influenciada pelos costumes franceses e, a partir dos 60, passamos a sofrer uma ‘invasão’ norte americana de influências culturais cada vez mais freqüentes na alma e na essência de nossa ‘brasilidade’ original. Hoje, somos muito mais próximos culturalmente dos Estados Unidos do que de nossos vizinhos sulamericanos.

O poder econômico das empresas e dos bancos dos países ricos controla o país mais pobre, cada vez mais endividado e sem possibilidades de investimento em sua produção industrial, crescimento e resolução dos problemas sociais de seu povo.

A principal característica dos países ricos capitalistas, cujos principais exemplos são Estados Unidos, União Européia e Japão, está na posse de suas empresas, fábricas e fazendas nas mãos de uma minoria de pessoas, e não dos verdadeiros donos, o povo e o Estado. Essas empresas privadas dos países ricos precisam crescer e aumentar cada vez mais seus lucros. Tal crescimento dos lucros começa dentro de cada país. As grandes empresas assumem então o controle absoluto de um mercado interno, derrubando as menores da concorrência.

As grandes empresas reduzem seus lucros vendendo seus produtos mais baratos. Dessa forma, destroem os pequenos concorrentes e os preços dos produtos voltam a subir posteriormente, ficando mais altos do que antes. O mercado interno de um país passa a então a ser dominado de forma absoluta e desaparece a livre concorrência, que é uma característica muito defendida pelos capitalistas para promover seu sistema.

Nesse estágio de monopólio absoluto, o Capitalismo sai de sua nação de origem e se espalha pelo mundo gerando o Imperialismo de que nós brasileiros tanto somos vítimas, quase sempre sem termos consciência desse processo de dominação.
  

A ONU (Organização Mundial das Nações Unidas), controlada pela minoria de países ricos, que se organizaram numa assembléia a fim de partilhar o mundo em retalhos de zonas de influência, chama seus fantoches econômicos de emergentes, no lugar da denominação anterior (países do 3º mundo). 
Peraí, emergente de onde para aonde, se não existe nenhuma sombra de possibilidade de um dia todos os países do mundo tornarem-se igualmente ricos. Se todos os países do mundo consumissem na mesma escala que os Estados Unidos, seriam necessários uns 3 planetas Terra como fonte de matéria prima; matemática impossível essa.


Tolos são aqueles que acreditam na historia imposta pelos países ricos para maquiar a sua dominação imperialista pelo mundo. É muito fácil classificar o presidente venezuelano Hugo Chávez como louco e inconseqüente, como é feito atualmente pela grande mídia.
 
Sempre que alguém conclama os países pobres a se unirem, logo é tratado com desdém e ares de desmoralização e descrédito pela grande imprensa, que por sua vez pertence aos grupos de comunicação ligados aos interesses imperialistas da elite interna de cada país. Essa elite se vende e escraviza seus semelhantes nacionais das classes sociais menos favorecidas.






Conscientização, reação e mudança são fatores que devem ser inseridos na educação de base do povo. A mudança deve começar pela fase de socialização das novas gerações, já que as gerações anteriores foram envolvidas desde seus verdes anos pelo modelo que aí está, e nunca possibilitará mudanças em termos de igualdade social e econômica.

O mal econômico, a miséria, a inflação, o crime e o caos nas grandes cidades brasileiras são simples reflexos do pior produto que vem de fora e nos é imposto sem possibilidade de escolha; um produto em forma de sistema, que a maioria dos brasileiros nem sabe que existe, trata-se do Imperialismo.
 
Autoridade, domínio e imposição: termos abstratos de um sistema que mostra-se apenas nas conseqüências e não na base de suas causas. Ocorre de forma sutil sem ação armada, mas domina, escraviza, invade, e subjuga seres humanos tão humanamente comuns quanto seus dominantes primatas e, porque não, imperialistas selvagens.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O FUTEBOL DE MESA





Por Cássio Ribeiro
 
Década de 60. O premiado pianista Arthur Moreira Lima está exilado em Moscou, na então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). A vida distante do Brasil foi a melhor alternativa encontrada diante da repressão imposta pela Ditadura Militar brasileira.


Ao arrumar a bagagem para a partida, Moreira Lima não esqueceu seu inseparável time de botões do Fluminense e, depois de alguns meses em Moscou, as regras do futebol de botão já tinham sido ensinadas a alguns soviéticos, que enfrentavam o pianista em partidas disputadas em pleno frio asiático.


Quando os amigos brasileiros iam visitar o pianista, também levavam suas equipes dentro das malas. Foi o que fez o arquiteto Alfredo Brito, em 1967, quando embarcou em um trem na Polônia, carregando um time do Botafogo em direção a Moscou, para a disputa do clássico entre Fluminense e Botafogo, conhecido como o clássico vovô do futebol carioca.


Na fronteira russa, Alfredo Brito foi revistado por policiais soviéticos que subiram no trem. A caixa com os botões, ao ser aberta, levantou suspeitas sobre o brasileiro. Os policiais queriam saber o que eram aquelas peças estranhas, acompanhadas de uma caixa de fósforos cheia de parafusos, que para os russos, certamente, seria uma bomba de estilhaços. Brito disse que se tratavam de football toys, e o nome da bomba era Osvaldo Baliza, goleiro do Botafogo no final da década de 40.


Toda a estranheza despertada nos russos se deu pelo fato de o futebol de botão ser um esporte muito conhecido só por aqui, sendo inclusive citado por muitos pesquisadores como um esporte genuinamente nascido no Brasil, embora não hajam registros preservados sobre a origem oficial do jogo de botão.


O autor Ubirajara Godoy Bueno, que escreveu o livro 'Botoníssimo', publicado em 1998, afirma que não há provas de que os garotos que brincaram de botão pela primeira vez fossem brasileiros, mas há muitos indícios.



No Brasil, quase todo garoto entre a década de 20 e o final do século passado tirou a cesta de frutas e o pano que cobria a mesa de jantar de casa para a disputa de uma animada partida. O “gramado” onde a bola corria durante os ataques e as tabelas entre os craques também podia ser improvisado em pátios de pedra polida e em corredores de madeira, porém, o “piso” preferido eram os lisos tacos em madeira, com uma convidativa camada de sinteco recém-aplicada. Na ausência do sinteco, a aplicação de cera doméstica comum resolvia muito bem a questão do toque de bola.

Jogador de futebol de botão é muitas vezes taxado como doido. Várias pessoas expressam incisivo preconceito quando vêem um marmanjão, muitas vezes cheio de cabelos brancos, debruçado sobre a mesa com uma palheta nas mãos. Alguns botonistas famosos que já passaram por tal situação são Jô Soares, Armando Nogueira, Casagrande e o já falecido e saudoso Chico Anísio.


O primeiro livro de regras sobre o futebol de botão foi o “Regras Officiaes do Football Calotex”, escrito pelo brasileiro Geraldo Décourt, aos 19 anos, em 1930. Décourt, que virou patrono do futebol de botão anos mais tarde, deu o nome de calotex ao jogo, porque calotex era o material importado com o qual se fabricavam as mesas domésticas na época.

Geraldo Décourt, patrono do futebol de botão

Embora os primeiros jogadores fossem tampas acrílicas de relógio disputadas por garotos nos balcões dos relojoeiros, durante a primeira metade do século passado, também marcaram época os “atletas” feitos a partir de casca de coco envernizada. 


Os primeiros craques de tampa de relógio

O que acabou dando o nome pelo qual o jogo é mais conhecido foram os enormes botões roubados das casacas da época. O futebol de botão usava inicialmente como bola, miolo de pão amassado, grãos de feijão, e irregulares formas próximas de cubos, esculpidas à gilete em rolhas de cortiça.

Os botões industrializados em acetato e os de galalite só começaram a ser produzidos na década de 1970. Nos anos 80, federações surgiram em todo o Brasil e o pequeno cubo, ou dadinho, roubou o cenário das outras bolas.

 Trave dos anos 70, ...
 e o goleiro de caixa de fósforos do Fluminense, como o que foi confundido com uma "bomba" sendo levada para Moscou
Botão do Bangu /RJ, em duas camadas e com faixa central de galalite ou madrepérola, fabricado na década de 80 



Botões do São Paulo e do Borússia em lance de disputa pelo dadinho, próximo ao meio de campo

Em 1988, o Conselho Nacional de Desportos concedeu a categoria de esporte ao jogo, com o pomposo nome de Futebol de Mesa. Foram oficializadas três regras: a baiana (onde cada jogador só pode dar um toque por vez na bola), a carioca (3 toques) e a paulista (12 toques). A bola esférica também foi introduzida. Com exceção do Brasil, o futebol de mesa não é reconhecido como esporte em nenhum outro país do mundo. 


Antigos botões com as imagens de Jairzinho, Garrincha e Pelé, junto às modernas bolas esféricas


 Partida de futebol de mesa em andamento

Na década de 90, o Clube dos 13, que reúne os 13 maiores times de futebol do Brasil, começou a cobrar fortunas pela licença dos escudos colocados pelas fábricas sobre os botões. Com isso, a produção nas indústrias baixou significativamente.

Com a evolução constante da realidade virtual dos videogames, o futebol de mesa foi perdendo espaço entre a garotada. Mesmo assim, hoje ainda existem muitos botonistas que realizam animados campeonatos em garagens, clubes e federações.


A Federação Paulista de Futebol de Mesa, fundada em 1962, conta hoje com mais de 3 mil sócios, e é reconhecida pela Confederação Brasileira de Futebol de Mesa (CBFM). Outra filiada à CBFM é a Federação Botonista do Estado do Rio de Janeiro (FEBOERJ).


Os escudos da Confederação Brasileira de Futebol de Mesa ...

e da Federação Paulista de Futebol de Mesa

O esporte conta com vários endereços na Internet, como o http://www.futeboldemesanews.com.br/, onde o internauta pode saber quais são os principais campeonatos em andamento e seus resultados, como também se inscrever para participar de torneios abertos a várias categorias. Um dos links na página inicial do site tem o nome de futebol de mesa de batom, e mostra entrevistas com algumas mulheres praticantes do esporte.



Já no blog www.escudosdebotao.blogspot.com/, o botonista pode baixar e imprimir escudos de clubes de todos os estados do Brasil, como também fotos dos rostos de jogadores que marcaram época em equipes italianas. Tudo isso poderá ser fixados como “camisa” nos seus craques.


 
 Atuais botões e goleiros usados em jogos oficiais
Professoras e psicólogas que introduziram o futebol de mesa nas atividades das crianças com as quais trabalham, afirmam que o esporte ajuda os jovens alunos a desenvolverem a coordenação motora global, o raciocínio lógico-matemático, o trabalho em equipe, a concentração e o aprendizado geral por meio do lúdico. De fato, muitas qualidades para quem nunca viu nada de bom e interessante nesse esporte tão brasileiro, e até já confundiu um goleiro do Botafogo com uma bomba de estilhaços prestes a ser detonada por um brasileiro “terrorista” arquiteto num trem a caminho de Moscou.

domingo, 12 de agosto de 2012

A REVOLTA DOS 18 DO FORTE DE COPACABANA






Por Cássio Ribeiro

Para o entendimento do que foi a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, ocorrida em 1922, é necessário compreender  primeiro os moldes republicanos implantados no Brasil a partir de 1889, quando o Império teve fim em nosso país, como também compreender o cenário político brasileiro no início da década de 1920.


A Primeira República ou República Velha foi instaurada em 1889, graças à aliança entre militares e fazendeiros de café. A classe militar desejava a implantação de um regime republicano representado por um poder centralizado e forte. Já os grandes cafeicultores queriam um sistema republicano federalista, onde cada estado teria autonomia econômica, como também uma administração política regionalizada.


Como os fazendeiros de café formavam a classe mais rica da sociedade brasileira naquela época, não foi difícil suas aspirações serem implantadas nos moldes políticos brasileiros da República Velha.


Dos 13 presidentes que o Brasil teve no período da República Velha (1889-1930), só 3 eram militares. Quase todos os 10 presidentes civis que governaram o Brasil naquele período eram bacharéis em direito formados pela Faculdade de Direito de São Paulo, onde havia também uma sociedade maçônica secreta, da qual todos os ex-presidentes civis também faziam parte.
A primeira bandeira adotada após a proclamação da Repúlica já deixava claro nossa aproximação ideológica com o sistema republicano norte-americano. Idealizada pelo republicano positivista Rui Barbosa, essa bandeira vigorou só por 5 dias, de 15 a 19 de novembro de 1889, quando foi adotada a bandeira brasileira atual
Outra característica marcante da República Velha, que a fez também ficar conhecida como a República do "Café com Leite", foi a alternância no poder presidencial entre mineiros e paulistas, garantida em suas bases pela "Política dos Governadores". Nela, o presidente da república apoiava os governadores estaduais e seus aliados, que garantiam a eleição de deputados e senadores fiéis ao presidente. Não havia assim, conflito entre o Congresso Nacional e os interesses dos presidentes mineiros e paulistas na República Velha.

No fundo, pode-se dizer que a República Velha era uma repetição dos moldes administrativos do Império. No lugar da Família Real, os ricos fazendeiros mineiros e paulistas se sucediam no poder da República do "Café com Leite".

No meio dessa sucessão presidencial entre representantes de Minas e São Paulo, que eram os dois estados mais ricos da Federação, o marechal Hermes da Fonseca foi eleito para governar o Brasil entre 1910 e 1914, sendo um presidente militar no meio da hegemônica alternância entre ricos fazendeiros mineiros e paulistas. Hermes da Fonseca era sobrinho do marechal Deodoro da Fonseca, que proclamou a República no Brasil, em 15 de novembro de 1889, e foi o primeiro presidente nacional.

Marechal Hermes da Fonseca: um presidente militar no meio da sucessão presidencial monopolizada por fazendeiros paulistas e mineiros


Nas eleições de 1910, São Paulo e Bahia apoiaram Rui Barbosa por meio da "Campanha Civilista", que associava Hermes da Fonseca ao militarismo. O Marechal Hermes venceu mas, ao fim de seu mandato, em 1914, a antiga política de divisão do poder entre as oligarquias paulista e mineira foi retomada.
Entre 1914 e 1918, o Brasil foi governado pelo mineiro Venceslau Brás e, de 1918 até 1919, pelo também mineiro Delfim Moreira. A partir de 1919, até 1922, o paraibano Epitácio Pessoa presidiu o Brasil, e foi pouco antes de sua sucessão, em 1922, que aconteceu a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana.
 Epitácio Pessoa: o presidente que teve que enfrentar a Revolta dos 18 do Forte



Na campanha para a sucessão presidencial de 1922, Minas e São Paulo apoiavam o mineiro Artur Bernardes como o próximo representante da política do "Café com Leite". O Exército, na oposição contra os fazendeiros dominantes, deu apoio ao candidato carioca Nilo Peçanha, que representava a "Reação Republicana" formada por uma coligação entre Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro.


O cenário político brasileiro começou a ferver quando o jornal Correio da Manhã publicou na edição de 9 de outubro de 1921, uma carta manuscrita atribuída ao candidato dos fazendeiros, Artur Bernardes. Na carta, o ex-presidente marechal Hermes da Fonseca foi classificado como um "sargentão sem compostura", e o Exército chamado de "antro de corruptos".
 O mineiro Artur Bernardes, a quem foi atribuída a autoria da carta injuriosa contra Hermes da Fonseca e o Exército. A suposta carta acabou desencadeando a Revolta dos 18 do Forte
Artur Bernardes venceu as eleições de março de 1922 sob forte acusação de fraude eleitoral. Aliás, durante a República Velha, era comum as oligarquias rurais garantirem a eleição de seus candidatos por meio do voto de cabresto e da fraude eleitoral. Não havia justiça eleitoral e o Presidente da República podia legalizar qualquer resultado que atendesse aos seus interesses, graças ao controle que exercia sobre as comissões de verificação das eleições.


Nesse cenário, que garantia o domínio do país pelos fazendeiros paulistas e mineiros, além da concentração populacional nas zonas rurais e intensa miséria nos meios urbanos, o povo saiu às ruas para protestar e exigir mudanças. O Exército foi convocado para conter rebeliões populares em Pernambuco. Em 29 de junho e 1922, o marechal Hermes da Fonseca, que era a mais alta patente do Exército na ocasião, enviou uma mensagem de telégrafo ao Recife dando a ordem para que os militares não reprimissem o povo. O marechal Hermes acabou preso em 2 de julho por ordem do presidente Epitácio Pessoa. O Clube Militar, que era presidido pelo marechal Hermes, também foi fechado.


O sentimento de afronta tomou conta das fileiras do Exército. O clima esquentou ainda mais quando o presidente Epitácio Pessoa nomeou o historiador e civil Pandiá Calógeras para o cargo de Ministro da Guerra.


O Forte de Copacabana era comandado na ocasião pelo capitão Euclides Hermes da Fonseca, que era filho do ex-presidente preso, marechal Hermes da Fonseca. Em julho de 1922, o Forte de Copacabana tinha 301 homens sob o comando do capitão Euclides Hermes.


No dia 4 de julho de 1922, os soldados do Forte cavaram trincheiras e minaram o terreno do interior do quartel em Copacabana. Todos os quartéis do Exército no Rio de Janeiro se rebelariam contra o presidente Epitácio Pessoa e seu sucessor, Artur Bernardes. A revolta começaria pelo Forte de Copacabana que, na madrugada do dia 5 de julho de 1922, iria disparar um tiro de canhão como senha para o início do levante. Os outros quartéis deveriam responder ao primeiro tiro do Forte de Copacabana logo em seguida.

Conforme o combinado, à 1h30 da madrugada do dia 5 de julho de 1922, o tenente Siqueira Campos disparou um dos canhões do Forte de Copacabana. A resposta dos outros quartéis não aconteceu e nada mais que o silêncio foi ouvido em seguida. O tenente Siqueira Campos esperou 10 minutos e gritou bem alto dentro do Forte: "Fomos traídos!"


Cúpula do canhão alemão Krupp do Forte de Copacabana, apontado para a cidade do Rio de Janeiro, no detalhe


Os canhões Krupp do Forte foram trazidos da Alemanha pela Marinha do Brasil. Desembarcados por guindastes elétricos de 80 toneladas, os canhões Krupp do Forte de Copacabana são 6 no total: dois de 305 milímetros, dois de 190 mílimetros e dois de 75 milímetros, com alcances de 23, 18 e 7 quilômetros respectivamente



O Governo tinha informações antecipadas sobre a revolta e mudou os comandos militares do Rio de Janeiro antes do início do levante. Só a Escola Militar de Realengo, onde eram formados os novos tenentes, e alguns quartéis da Vila Militar, precisaram ser contidos no amanhecer do dia 5 de julho. No demais, apenas os 302 homens do Forte de Copacabana estavam rebelados sozinhos contra a República Velha Brasileira naquela manhã.

O tenente Siqueira Campos então fez vários disparos de canhão. Os alvos foram o Quartel-General do Exército no Campo de Santana, o Quartel-General da Marinha na Praça Barão de Ladário, o Depósito Naval na Ilha das Cobras, O Forte de São João na Urca, a Fortaleza de Santa Cruz em Niterói e o Forte do Vigia, que ficava no alto do morro do Leme, e onde morreram quatro pessoas, vítimas dos disparos feitos a partir do Forte de Copacabana.
O Forte de Copacabana também foi severamente bombardeado pelas tropas do Exército fiéis à República Velha, durante todo o dia 5 de julho. A fortaleza de Santa Cruz, do outro lado da entrada da Baía de Guanabara, em Niterói, despejava todo o potencial de sua artilharia pesada sobre o Forte de Copacabana. Os amotinados, liderados pelo capitão Euclides Hermes, ameaçavam bombardear toda a cidade do Rio de Janeiro.
Vista aérea do Forte de Copacabana por dois ângulos: com o morro Dois Irmãos e a Pedra da Gávea ao longe ...
e com águas calmas ao redor e a praia de Copacabana à direita
Já na madrugada do dia 6 de julho, o Ministro da Guerra, Pandiá Calógeras, fez uma ligação telefônica para o Forte de Copacabana, ordenando a rendição imediata dos rebelados. O Capitão Euclides Hermes e o Tenente Siqueira Campos resolvem deixar sair todos os homens que desejassem se render.

Siqueira Campos diria na ocasião: "Não temos o apoio de ninguém, perdemos a revolução. Não vou enganar ninguém, perdemos a revolução e só nos restam dois caminhos. O primeiro é nos entregarmos como covardes, e o segundo é sairmos por aí lutando até não podermos mais e morrer ou conseguir chegar até o Catete para dizer ao presidente da República do nosso repúdio. Mas também não quero levar ninguém ao suicídio. Quem quiser abandonar o forte, ainda está em tempo."


Foram dados 10 minutos de prazo para a decisão dos homens. Quem optasse por lutar, deveria ficar de um lado do quartel. Os outros poderiam sair do Forte. Os portões do Forte foram abertos e, dos 302 homens amotinados, 273 optaram pela rendição.


Um destróier e os couraçados São Paulo e Minas Gerais reforçaram o bombardeio ao Forte, onde ainda resistiam o capitão Euclides Hermes e seus 28 fiéis comandados. O ministro Calógeras deu outro telefonema ao Forte de Copacabana e exigiu a rendição incondicional, afirmando que, em caso contrário, todos os rebeldes seriam massacrados.


O capitão Euclides Hermes deixou o Forte e foi ao encontro do ministro Calógeras para conversar pessoalmente, mas, ao chegar no Palácio do Catete, onde estava o Ministro, foi preso imediatamente.

No Forte de Copacabana, ainda estavam 28 rebelados. O Tenente Siqueira Campos tomou então a decisão histórica: sair numa marcha suicida pela Avenida Atlântica rumo ao Palácio do Catete, a fim de concluir e deposição do Presidente Epitácio Pessoa.



Antes de saírem do Forte de Copacabana, os militares usaram um canivete para dividirem entre si uma bandeira do Brasil em 29 pedaços. Cada um colocou seu pedaço junto ao peito, preso na parte interna da farda. Um dos pedaços foi guardado para ser entregue ao capitão Euclides Hermes posteriormente.

Os portões do Forte de Copacabana foram abertos às 13 horas do dia 6 de julho de 1922. A histórica marcha suicida pela Avenida Atlântica teve inicio com 28 militares rebeldes armados com seus fuzis. Alguns debandaram, outros foram presos, esse e aquele morreu baleado. Curiosamente, o engenheiro civil gaúcho Otávio Correia, vestindo terno e chapéu, presenciava os combates e resolveu integrar-se ao levante. Pegou um fuzil e se juntou aos 18 militares revoltosos que ainda resistiam.
  
A histórica foto da marcha final dos rebelados do Forte de Copacabana. O civil Otávio Correia é o quarto da esquerda para direita. Esta foto, que é um dos maiores registros da História do Brasil em todos os tempos, foi feita pelo fotógrafo Zenóbio Rodrigo Couto, que, na ocasião, arriscou a própria vida para imortalizar a cena. Zenóbio era fotógrafo do antigo jornal carioca "O Malho"
  
Outro registro da histórica caminhada suicida rumo ao combate final com as tropas do Exército leais ao presidente Epitácio Pessoa
Os últimos tiroteios duraram cerca de meia hora. Cercados por 3 mil homens do Exército, já nas proximidades do Leme, os 18 militares e o civil foram sendo abatidos um a um. Só os dois últimos, os tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes, foram capturados baleados mas sobreviveram.

O jornalista Assis Chateaubriand (1892-1968) acompanhou o episódio e escreveria posteriormente: "Na praia eu assisti de perto os últimos combates, e pude ver a areia ainda quente, embebida do sangue dos bravos que sucumbiram de um lado e de outro".


Da histórica Revolta dos 18 do Forte de Copacabana nasceria um movimento militar que influenciaria na vida política brasileira por 4 décadas depois dos anos 20, o Tenentismo.


Oito anos mais tarde, em 1930, os tenentes apoiaram Getúlio Vargas na derrubada da República Velha. Nascia assim a República Nova de Vargas. Alguns historiadores afirmam que o Tenentismo e suas idéias permaneceram até a década de 1970, quando seus últimos representantes morreram.


Não se pode deixar de lembrar aqui que muitos dos generais que conspiraram para depor o presidente João Goulart no Golpe Militar de 1964, eram os tenentes das décadas de 20 e 30 que "amadureceram" e, finalmente, ao atingirem o generalato, calaram covardemente o Brasil, torturando, enforcando e sufocando sua democracia. 

domingo, 5 de agosto de 2012

BIQUÍNI: A EVOLUÇÃO DOS 4 "TRIÂNGULOS DE NADA"






Por Cássio Ribeiro

1º de julho de 1946. A marinha dos Estados Unidos realiza uma série de explosões nucleares a fim de testar bombas atômicas no Atol de Bikini, ao sul do Oceano Pacífico, perto da Oceania.


Teste nuclear da marinha americana em 1946 ...


 no Atol de Bikini, localizado no Oceano Pacífico



Dois dias depois, em 3 de julho de 1946, o francês e engenheiro mecânico desempregado Luois Réard apresentava ao mundo uma inédita peça da vestimenta feminina, que ele mesmo chamou de biquíni, já que tinha a certeza de que, mesmo naquela sociedade liberal européia da década de 40, o pequeno traje seria encarado como uma explosão nuclear; e foi.


Comparado com os modelos de hoje, o biquíni inicial era um tanto comportado. Mesmo assim, nenhuma modelo daquele ano de 1946 aceitou vestir-se e desfilar no lançamento da nova peça, que cabia em uma caixa de fósforos. Esse primeiro biquíni usado no lançamento trazia a disposição da página de um jornal em sua estampa.


A tarefa de modelo acabou sobrando para a francesa Michelini Bernardini, uma dançarina que fazia show tirando a roupa todas as noites em uma casa noturna de Paris. Michelini então desfilou e posou para fotos à beira de uma piscina em Paris, naquele julho de 1946. Os jornais da época descreveram o primeiro biquíni como "quatro triângulos de nada".



Michelini Bernardini no momento do lançamento do biquíni, segurando a caixa de fósforos da qual a paça saíra antes de ser vestida por ela. A estampa do primeiro biquíni reproduzia a página de um jornal

Apesar do escândalo, Michelini recebeu 50 mil cartas de admiradores. Mesmo sendo sensação de divulgação na imprensa da época, o biquíni chegou às lojas mas não fez sucesso num primeiro momento. O tradicional maiô ainda roubava a cena numa época em que o biquíni representava escândalo.

Essa realidade só começou a mudar graças ao Cinema, onde a atriz francesa Brigitte Bardot atuou sem inibição nos filmes "E Deus Criou a Mulher", em meados da década de 50, e "As Noviças", em 70. 

 Brigitte também contribuiu para a popularização do Biquíni no Brasil, depois que fotos suas desfilando no verão de 64 com um minúsculo biquíni em Búzios, no RJ, ganharam o mundo. Até esse fato, o biquíni só era usado no Brasil pelas vedetes do teatro rebolado.



Brigitte Bardot no filme "As Noviças", de 1970


Ainda na década de 60, com a onda de liberalismo que tomou conta do mundo, o biquíni passou a representar um comportamento de mulheres que buscavam a independência e a liberdade numa forma de protesto, tanto que o então presidente Jânio Quadros (1917–1992), proibiu o uso do biquíni nas praias brasileiras, por meio de um decreto assinado em 1961. 

A proibição foi a espoleta que faltava para deflagrar o uso desenfreado da peça, que só diminuía de tamanho com o passar dos anos.


Já na década de 70, a ousadia reuniu o biquíni com a exposição de uma barriga de 7 meses de gravidez na praia de Ipanema. Essa ousadia tinha um nome que ficou famoso como um símbolo de atitude da liberação feminina: Leila Diniz, que foi a primeira grávida a desfilar de biquíni em público, no ano de 1971, na famosa praia carioca.


Leila aos 7 meses de gestação em Ipanema, em 1971


 A atriz niteroiense Leila Diniz morreria um ano depois, em um acidente de avião ocorrido em Nova Délhi, Índia, em 14 de junho de 1972



A partir de Leila Diniz, o Brasil, graças aos seus 7 mil quilômetros de praias e verão durante quase todo o ano em alguns lugares, passou a despontar como o grande celeiro de tendências da moda dos biquínis.


A carioca Rose di Primo lançou a tanga ainda nos idos dos anos 70, aos 16 anos, quando substitui as laterais de um biquíni muito apertado, e que não passava pelas pernas, por tiras de pano. Apesar dos protestos de sua mãe, Rose escandalizava diariamente a liberal Ipanema com seus minúsculos modelos de tanga recém criados.


Na década de 80, o Brasil se consagra e se firma no cenário mundial como líder da produção de biquínis, e na vanguarda das tendências de novos modelos. 

As inovações surgem sobre os corpos esculturais de verdadeiras deusas como Monique Evans (e seu famoso topless), Luiza Brunet, Isadora Ribeiro e toda uma constelação adornada pelos modelos enroladinho, sutiã cortininha e asa delta. Quando o tamanho não tinha mais para onde diminuir, surgiu mais um modelo 100% brasileiro chamado fio dental, que acabou ganhando as praias de todo o mundo e, ainda hoje, é o preferido das mulheres mais jovens. 



O modelo asa delta: sempre destacando a beleza e o charme escultural da mulher carioca






O fio dental de Isadora Ribeiro e ...




o atual modelo fio dental, mais "radical"



Nos anos 90, o biquíni ganha acompanhamentos ditados pela moda: cangas coloridas, óculos, saídas de praia, chapéus, chinelos e toalhas.


O Brasil hoje é o país que mais fabrica e consome biquínis no mundo, além de ter a qualidade de suas peças reconhecida mundialmente pelo estilo ousado e pela criatividade dos modelos. São cerca 60 milhões de biquínis produzidos todos os anos no país, dos quais, 9 milhões são exportados. 


A modernidade evolutiva proporcionou agilidade e qualidade na produção das peças: corte dos modelos a laser, tecidos que secam rapidamente e repelem os raios solares nocivos ao corpo, além de impedirem a proliferação de bactérias.

Ainda está longe de existir, mas os especialistas afirmam que algumas futuras inovações serão tecidos que mudarão de cor conforme a temperatura e possuirão propriedades anticelulite e antiestrias.


Ao biquíni, sempre associado ao corpo daquela que talvez seja a mais perfeita de todas as criaturas já concebidas, a mulher, resta a definição dada por uma das mais importantes editoras de moda do mundo, Diana Vreeland (1903-1989), com passagem pelas revistas americanas de moda Vogue, Harper’s e Bazaar: "É a invenção mais importante deste século 20, depois da bomba atômica", disse ela.